quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Fidus Interpres - A Prática da Tradução Profissional

Iniciando a série de posts sobre livros de tradução, tentarei falar um pouco sobre o livro Fidus Intepres – A Prática da Tradução Profissional. Digo que tentarei porque, apesar das minhas boas intenções ao levar a vocês algumas resenhas pessoais sobre livros de tradução, estou numa posição um pouco desvantajosa ao escrever sobre um livro tão rico e que já recebeu tantos elogios.
Eu conheci o livro no começo de 2011 através da minha amiga, e também tradutora, Paula Maurício. Paula, que veio da área de Relações Internacionais, estava dando uma virada em sua vida profissional e resolveu investir profissionalmente na carreira de tradução. Nos conhecemos na Pós-Graduação que estamos concluindo em Metodologia da Tradução em Língua Inglesa e, ao saber do meu amor por livros e em especial, a obsessão por livros de tradução, ela disse que iria me emprestar um livro muito bom que tinha comprado. Fiquei bastante ansioso e surpreso, no dia em que o recebi, ao pegá-lo em minhas mãos e não reconhecer naquele momento o autor ou o assunto do livro. Tinha me acostumado a pesquisar bastante sobre a área e mesmo os livros que não tinha lido me eram familiares pelas referências citadas em trabalhos ou pelo nome do autor. Confesso que a primeira impressão (causada talvez pelo título em latim) foi de que o livro era um manual de como bem traduzir, ao estilo de muitas obras prescritivas que apareceram durante os séculos 16 até o 20.

Ao folheá-lo, no entanto, mudei rapidamente a percepção e comecei a me interessar pelos assuntos muito atuais, pela estrutura acessível dos capítulos, e principalmente pela abordagem extremamente prática e pé-no-chão com que o ofício da tradução é tratado. Se há um comentário recorrente que percebi em todas as resenhas que li é o que alega o quanto o livro teria sido importante no início da carreira de tradutores hoje já experientes, e do quanto teriam se beneficiado com as dicas e macetes ali presentes se existisse um manual assim no tempo deles. Vou cair no lugar comum e repetir esse mesmo argumento aqui, mas com uma ressalva: eu também teria adorado ter conhecido esse livro antes, mas acho que na nossa profissão estamos sempre nos renovando e aprendendo a acompanhar as evoluções que o mundo nos apresenta, que o mercado nos impõe e que os clientes nos exigem. Sendo assim, Fidus Interpres não poderia ter vindo em hora melhor.

O livro é filho do blog profissional homônimo do tradutor brasileiro radicado na Alemanha, Fábio Said. Durante vários anos, ele enriqueceu o blog com dicas valiosas e contribuições estimulantes sobre a profissão de tradutor e tudo o que a ela possa estar ligado. O livro veio como uma consequência do grande interesse que as pessoas vinham e vêm mostrando para com a área, e não só dos profissionais, mas de muita gente que ultimamente tem aberto os olhos para essa profissão tão presente em nossas vidas, mas que de tão discreta às vezes é dita invisível.

O Autor

Creio que o que destaca Fábio Said de muitos outros profissionais por aí é a sua postura ética, extremamente profissional e pragmática e, principalmente, o comprometimento em ajudar os principiantes e interessados na tradução. Numa época em que atitudes colaborativas têm sido bastante valorizadas, mas que alguns ainda tendem a ignorá-las, visando simplesmente ao lucro pessoal a todo custo, Fábio sobressai como um profissional singular. Digo isso sem nenhum exagero ou puxa-saquismo. Reflita comigo: ser tradutor representa, na maioria esmagadora dos casos, ser um profissional autônomo, freelancer. Ou seja, seu tempo é valioso, já que além de prospectar novos clientes, fidelizar os antigos, mostrar sempre sua cara para o mercado, se destacar num mar de pessoas incapacitadas que acreditam que passar um mês na Disney a habilita a traduzir, você ainda precisa efetivamente pesquisar, traduzir, revisar, cobrar clientes e ter uma vida minimamente pessoal. Onde ficaria o tempo para se dedicar a qualquer outra coisa que não fosse sua carreira? Pois, além de dar conta de tudo isso, Fábio ainda encontra tempo para conduzir seriamente seu blog, com postagens regulares e de interesse genuíno, responde com presteza a quem entra em contato com ele e como se não fosse trabalho demais, resolveu ir além e publicar de forma independente o livro Fidus Interpres.

A Obra

Quem mexe com mercado editorial e entende alguma coisa sobre isso deve fazer ideia do quanto é difícil conseguir ser publicado. É preciso ralar bastante, sair batendo na porta de várias editoras e torcer para que a sua peregrinação um dia dê resultado. Se der e você fizer sucesso, dá até para se sentir recompensado e deixar a editora fazer o resto do trabalho. Mas, como Fábio não ia ficar perdendo tempo por aí atrás de editora e correndo o risco de esperar muito tempo até conseguir ser publicado, ele seguiu sua tradição e resolveu tudo por conta própria. Mais uma vez, puxou a responsabilidade para si, acreditou no seu projeto e hoje o livro já está em sua segunda edição, com conteúdo extra sobre ética profissional, além de poder ser encontrado em versão digital e-book.

O fato de este livro não ter sido publicado por uma editora comercial em nada afetou sua qualidade gráfica ou distribuição. A capa da segunda edição está ainda mais bonita, com cores agradáveis, e um tratamento de primeira. Quanto à distribuição, é possível encontrá-lo online no site do Clube de Autores, através do próprio blog Fidusinterpres.com e até na Amazon! Sempre há promoções e você pode até entrar em contato direto com o autor e encomendar uma cópia autografada. Para quem é de Pernambuco, o livro está disponível na livraria SBS.

A Prática Profissional

Quem acompanha meu blog regularmente ou pelo menos leu o post sobre o I Encontro de Tradução em Pernambuco viu que eu apresentei uma palestra em que trato da questão do ensino da Tradução nas Universidades Brasileiras. Uma das minhas maiores queixas é do excessivo mergulho na teoria e quase total esquecimento da prática. Os que me conhecem sabem que eu não sou contra a teoria; pelo contrário, ela é importantíssima para nos dar os alicerces sobre os quais construir a nossa prática, mas teoria em excesso acaba não se traduzindo em nada (com o perdão do trocadilho) se não houver a prática para corroborá-la ou refutá-la. É nesse sentido que o livro Fidus Interpres vem preencher uma lacuna gritante em termos de material de leitura sobre tradução com foco nas atividades profissionais dos tradutores. 

Ainda hoje, 4 anos depois de formado em Tradução e terminando uma pós, quando alguém vem me perguntar sobre relação com clientes, regras de preço, como redigir um currículo de tradutor ou ferramentas de tradução, titubeio um pouco para responder que não aprendi nada disso na Universidade. Muita coisa lá girava (e creio que se o curso da Federal de Pernambuco ainda existisse continuaria a girar) em torno da questão da fidelidade do tradutor e do maldito ditado traduttori tradittori. Gente, essa é uma discussão que vem desde Cícero na História Antiga, e é até importante conhecer seus desdobramentos, mas a profissão está longe de se resumir a isso. Nunca vamos chegar a um acordo sobre o que é melhor, ser fiel ao original ou à língua receptora, mas precisaremos, sim, decidir quando aplicar qual viés quando estivermos prestando um serviço a um cliente. O bom, hoje, é que quando essas mesmas pessoas me perguntam coisas práticas eu não preciso indicar fontes esparsas e me confiar apenas na experiência própria, apresento a elas o livro Fidus Interpres.

Talvez por ainda não figurar entre os mais conhecidos livros de tradução, alguns professores desconheçam a obra e se espantem quando alguns alunos chegam com ela para lhes mostrar. Infelizmente, nesse sentido alguns docentes estão para trás e não conseguem acompanhar tudo o que vem surgindo mundo afora. Por isso, se torna importante divulgar obras como esta e seguir a linha que Fábio adota de proporcionar conhecimentos úteis a quem se encontra perdido no início da profissão, ou aos que querem ingressar nesse ramo e não têm noção do escopo que ela abrange. Fui convidado a ministrar uma disciplina de tradução para meios audiovisuais (dublagem e legendagem) na turma de pós-graduação de Tradução ano que vem e sem dúvida introduzirei nas leituras recomendadas e lidas em sala este livro. A Universidade deve começar a olhar para fora de seus muros e colher de lá os frutos provenientes daqueles que já passaram por ela e hoje estão bem sucedidos em sua carreira.

Como eu falei lá em cima, a estrutura do livro é tão bacana que mesmo depois de lê-lo, você sente prazer em continuar voltando a ele para consultar uma ou outra dica bacana que aprendeu. A organização é prática e você consegue encontrar rapidamente um tópico, podendo até lê-los fora de ordem sem prejuízo para o entendimento. Uma das partes que eu mais gostei foi sobre as ferramentas para aumentar a produtividade no dia a dia e também a seção sobre refinamento de buscas em sites como o Google.

Mas, se eu continuar tratando de cada capítulo aqui vou acabar entediando você, leitor, e isso não faria jus à excelente escrita do Fábio. Além do que, o objetivo é também deixá-lo curioso para ir buscar a obra. Todavia, recomendo fortemente a excelente resenha publicada no último boletim da ATA (A Associação de Tradutores Americanos) feita por Peter Gergay e encontrada aqui. A resenha está em inglês e trata minuciosamente de cada capítulo. 

Fábio já sinalizou o interesse de nos brindar com mais livros para 2012/2013. Pois que venham mais obras como essas para enriquecer nossos conhecimentos!

No Próximo post falarei do livro Conversas com Tradutores.


Não perca a minha lista de 30 livros sobre Tradução no Frugar. Clique aqui para saber mais.

Até lá.